Ontem foi um dia que não vou esquecer tão cedo, o dia da endoscopia.
Apesar de andar a tomar algo para estar tranquila a realidade é que na noite anterior não preguei olho. Por mais que não quisesse pensar naquilo, era o pensamento do tubo na goela que esteve sempre presente. Saí de casa a morrer de fome e a precisar da minha torradinha e do copo do leite, mas lá tive de ir com o estômago colado às costa. Fiz a Inscrição meia hora antes da hora do exame e naquela altura em que me sentei à espera deu-me vontade de esganar uma mocinha que estava a meu lado a roer bolachas. Certo que eu queria uma torrada, mas com a fome que estava até aquelas bolachas horrorosas marchavam. Como se não bastasse ainda tive de esperar hora e meia até ao doloroso exame. Sim, sim doloroso e desta vez falo com conhecimento de causa.
Tenho noção que sou uma piegas, que choro com facilidade e tenho dificuldade em controlar os nervos, mas que aquilo custou disso não tenho duvidas.
Quando a menina enfermeira me pediu para me deitar na maca já eu estava numa choradeira, festinha daqui, festinha dali lá me acalmei, mas depois quando vejo o tubo, ou melhor a mangueira (sim, porque pela dimensão aquilo parece mais uma mangueira para apagar incêndios) mais uma choradeira. Pede-me para abrir a boca e como vi a mangueira lá longe abria-a sem problemas. O pior veio depois, quando o sabor horrível do gel que colocou na minha boca começou a dar ar da sua graça. Bem, quem inventou aquela porcaria deve detestar pessoas e obriga-as a saborear algo intragável. Ainda sinto o sabor amargo. Ainda assim creio que o vinagre é um bocadito pior. Para quem não sabe, odeio vinagre e considero o pior cheiro que alguma vez cheirei e imagino que o sabor não seja melhor.
Ainda eu estava a lutar para que aquele sabor terrível desaparecesse chega a médica com a mangueira na mão e explica o que tenho de fazer. Segundo ela apenas tinha de respirara pela boca e pelo nariz e quando o tubinho (palavras dela) estivesse para passar a garganta apenas precisava de engolir. Facílimo...na teoria, porque na prática estava a sufocar. Não conseguia respirar e muito menos engolir. O exame demora cerca de dois ou três minutos, mas esse tempo pareceram-me horas.
Para resumir vou usar uma frase que um amigo uma vez disse (sobre o tal exame) " Fazer uma endoscopia ou morrer não deve de ser muito diferente".
Estou viva, é certo, mas o sabor horrível (ainda, que apenas na memoria), a dor na garganta, o lábio inchado, o trauma e a inflamação no duodeno ninguém me tira.
Agora resta aguardar a consulta na médica de família para saber o que tenho de tomar e o que não posso comer.
Sinto-me de mãos e pés atados e como se não bastasse o coração está apertadinho.
Imaginemos a história:
Um casal jovem (bem próximo de mim) com filhos que aparentemente se dá bem. Um dia, ele resolve com a concordância da companheira (acho eu) ir trabalhar para um país estrangeiro. Tudo corria bem e isso notava-se nas várias viagens feitas para ver a família.
Certa altura, ela diz-me que ele tinha-se apaixonado por outra mulher (oriunda desse país).
Tenho de confessar que fui apanhada desprevenida, mas ainda assim pensei "bem, pelo menos foi honesto e não fez o que muitos fazem, em que têm a esposa e uma amante".
Pelo meio ficou a desilusão dos meus pais...não foi fácil contar, ainda mais no dia de aniversário do meu velhote.
Apesar de todos o criticarem, eu não o fiz, claro que não fiquei feliz, mas não lhe podia virar as costas. Fiquei mais tranquila depois de falar com ele, pois o país onde está tem uma cultura muito rigorosa em relação às mulheres, uma cultura nada liberal e muito diferente do nosso.
Naquela altura garantiu-me que estava com a outra pessoa por amor e não por pressão ou "obrigação".
O tempo foi passando e a dor da ex. companheira começava a diminuir.
Um dia, ela diz-me que ele vem a Portugal para a vir buscar, pois tinha visto o erro que tinha cometido.
Mais uma vez fiquei surpreendida, creio que ainda mais do que quando soube da separação.
Falámos muito...quis saber se estava pronta para perdoar, se ia conseguir viver sem se lembrar da traição, se se sentia capaz de viver num país com tantas restrições, especialmente relacionadas com as mulheres, se ia conseguir viver num país onde tinha de andar com o corpo bastante coberto e sem as liberdades que estava habituada. A resposta dela foi "sim, estou preparada".
Lembro-me de lhe ter dito “Gostaria de dizer que estou feliz por ti, mas o que sinto é preocupação” (seria o sexto sentido a funcionar?).
O que ela não estava preparada, nem eu, nem ninguém da família é que passado cerca de um mês o companheiro voltasse para a outra.
Não seria trágico se ela estivesse no seu país, junto das pessoas que conhece e que a língua falada fosse entendida por ela...
Felizmente que existe Internet para não se sentir tão só e para acharmos solução para poder vir embora.
Não que não tenha mais coisas para me preocupar, mas este assunto tem estado diariamente na minha cabeça e só sossego quando ela se encontrar na sua casa.